segunda-feira, 3 de julho de 2006

O Estado Democrático como sancionador e educador!

Qual é o valor de um crime cometido por um menor? Qual é o valor de uma sanção severa sobre um crime cometido por um menor?
Hoje no Tribunal de Família e de Menores do Porto iniciou-se o julgamento do processo respeitante ao homicídio de um travesti transsexual, cometido por um grupo de menores nas ruas da cidade do Porto. São já várias as pressões feitas sobre o Estado Português no que diz respeito a uma punição exemplar deste crime, tanto por grupos defensores dos direitos dos homossexuais como até mesmo pelo Parlamento Europeu.

O homicidio cometido com dolo eventual é a sugestão do Ministério Público. Dolo eventual significa que houve uma desvalorização do resultado da acção, ou seja, o grupo em causa pratica uma acção (as agressões) e desvaloriza completamente a consequência desta, não ignorando totalmente o seu resultado (isto para explicar de uma forma simples).

Ora, meus amigos a minha questão é esta: imaginemos que as provas são evidentes quanto à situação que vos coloquei. Que tipo de sentença deve proferir um tribunal de menores num caso destes?
Vou mais longe. Do ponto de vista social e moral, o que aconteceu aqui foi um caso gritante de falta sensibilidade moral, perda de valores e desresponsabilização do acto., para além de uma enorma falta de tolerância (e estou a ser brando e contido nas palavras). Deve o Estado ter em conta a idade, a condição social, o ambiente familiar destes jovens e ser brando na sanção aplicada ou, por outro lado, deve ser duro, implacável, mas justo, punindo inequivocamente e pedagogicamente esta situação?
Parece-me que o Estado deve tomar uma postura severa neste tipo de casos. Este grupo de adolescentes com facilidade se torna num grupo delinquentes, e para evitar que caiam na delinquência deve o Estado travar esse percurso com a reclusão tendo como prioridade absoluta a educação destes menores fazendo com que terminem a escolaridade obrigatoria e que sejam sempre acompanhados com ajuda psicológica para que se possam integrar com mais facilidade numa vida em sociedade que desprezam, a avaliar pelo acto.

Esta ideia tem por base a falta de responsabilidade que se instalou na mente colectiva de grupos de risco (aqui significando desfavorecidos, condição social baixa) e que influencía substancialmente um pre-adolescente fazendo-o perder o controlo sobre os seus valores e os valores da sociedade onde se insere, e isto se alguns valores lhe foram incutidos. Nesta idade a percepção da realidade já começa a ser independente, autónoma e se a escala de valores for muito reduzida corre-se o risco da pessoa degenerar e acabar por adoptar comportamentos desviantes. Importante é também a fase de pre-adolescência no sentido do que será o futuro para estas crianças. Quero com isto dizer que é a partir daqui que a pessoa decide que caminho irá seguir na sua «vida moral», como adaptará o seu conhecimento à realidade.

Em suma, gostava que reflectissem sobre este assunto. É claro que podem encontrar autores portugueses que falam sobre este tipo de questões de uma forma mais aprofundada. Eu analisei isto de uma maneira extremamente superficial. Notem, também, que não é minha intenção culpar a priori este grupo mas sim reflectir sobre a essência da questão: os factores de educação primária e secundária, o decréscimo da consciência moral colectiva e individual, etc.

Nota: Esta é uma paixão que só me é possivel apresentar por escrito dado o peso do seu conteudo que tornaria qualquer sessão enfadonha. Mas, para que todos percebam, ela tem a ver com o direito como braço prático da filosofia.

5 comentários:

hörster disse...

Sim senhor, Jorge!
Excelente assunto. Eu sou a favor da educação e da responsabilização. É o que verdadeiramente faz falta neste país é o sentido de responsabilidade e consequências dos actos.

Como diz o ditado, é de pequenino que se torce o pepino, e se estes miúdos não levam já uma bela duma torcidela agora, o risco de se tornarem uns belos de uns delinquentes no futuro será bem alto. Pior do que o extermínio da vida de alguém existe pouco. Qual será a noção de responsabilidade com que crescerão se saírem impunes ou brandamente punidos depois deste acto?

A responsabilidade é, de facto, uma palavra pouco conhecida do nosso dicionário. E esse desconhecimento ocorre a todos os níveis. Jorge, terei todo o gosto em te ouvir falar do assunto.

Posso, já agora, dar mais um exemplo fantástico que não acaba em morte mas pode acabar. À porta da lota existe um mercado, chamado mercado de 2ª venda, com condições, ou antes, sem quaisquer condições de higiene, onde é vendido pescado de proveniências diversas. Se, por ventura, houver uma inspecção sanitária ao local, o encerramento é imediato. O engraçado é que não é realizada qualquer inspecção pois o Estado não sabe de quem é a responsabilidade sanitária do local, se da Câmara Municipal, se da Direcção Geral de Veterinária...

António Manuel Rodrigues disse...

Como sabes, Jorge, gosto de assumir a posição humanista, o contexto desta história, e da minha visão sobre a mesma, é demasiado longo, mas vou tentar resumir...

Não acredito no castigo, nem nas prisões, nem na transformação de pessoas em monstros, mas acredito em justiça, em responsabilidade e em seres humanos.

Estes putos são um produto (lugar comum) e não podem ser culpados do que não sabem, a crise de valores não é só deles ou das suas familias, é nosso, do nosso estado, da nossa organização social (mais um lugar comum) de todos nós que fechamos os olhos e já não acreditamos em controlo social, nem no sentido critico, nem no facto de sermos animais capazes do melhor e do pior...

As duas soluções práticas resumem-se a um castigo severo ou acompanhamento futuro. Vão haver vários adeptos de uma e outra. Continuo a acreditar que resumir a questão q isto é ser redutor, as questões que tu levantas são pertinentes por isso mesmo...

Agora divido-me... Porque, por um lado, a "politica do coitadinho" dá-me voltas ao estomago, o desculpabilizar, educar e acompanhar já vem tarde. Por outro, a posição severa de responsabilização, que eu defenderia, vai ter uma consequencia obvia para todos estes garotos, vai fazer deles delinquentes, que vão acreditar toda a vida que o mundo os castigou por uma falha infantil...

O mundo moderno (não é só Portugal) salta entre estes dois extremos, a palavra responsabilidade perdeu o sentido quando deixamos de nos preocupar com o que os nossos vizinhos dizem de nós (dito de uma forma simplista), e a "responsabilidade" é tanto individual quanto colectiva.
As orientações politicas e ideológicas colam-se, tendencialmente, a um deste lados (acredito mais por teimosia que bom senso) divergindo nas causas e nas consequencias, talvez seja altura de pensarmos nas pessoas, assumir que o mundo não é linear, a preto e branco, é colorido e com variações tonais infindaveis...

Ninguem pode saber o que vai ser o seu futuro (independentemente da resolução deste caso), nem o que pode provocar esse futuro, se vão ser delinquentes ou adultos responsaveis e conscientes.

Confesso que não tenho a pretensão de julgar as causas que modificam o nosso destino, mas ser inconsequente e não acreditar que o futuro é consequencia do passado é a primeira irresponsabilidade da nossa organização politica e social. Os serviços cívicos sempre me agradaram, mas parece que dão muito trabalho a quem os impõe e coordena...

Para concluir, acho que a posição neste caso devia ser severa, mas o isolamento não me parece solução, o laxismo também não. Este miudos não são monstros, mas também não são coitadinhos.

GRaNel disse...

A conclusão do Tó parece-me que resume tudo. Devo é frisar que eles estão bem mais erto do monstro do que do coitadinho. Com aquela idade, ninguem me convence de que já não têm conscência da gravidade do crime que estão a cometer. A escolha da vitima tambem não é inocente. Por tudo isto, tenho de concordar com um castigo pesado. A nossa sociedade é neste momento demasiado permissiva e desculpabilizadora... é tempo de segurar as rédeas e defender os valores que ainda existem.

Rui Vieira disse...

Também eu não sou adepto da "teoria dos coitadinhos" quando as situações atingem tal gravidade. E compreendo a preocupação pelas sanções que esse grupo de adolescentes irá receber. A minha duvida é perceber o que esses miudos e a sociedade irão ganhar com tais sanções.
Será que o tempo de cativeiro servirá para acompanhar psicologicamente os miudos e explicar-lhes o valor da vida humana ou vai apenas agravar a sua marginalidade?
Será que a sociedade vai continuar a atacar os sintomas em vez das causas? Morre o transexual, identificam-se e punem-se os agressores. Fica toda a gente contente, muito em especial o Parlamento Europeu. Mas... quanto às condições sociais de onde emergiu este grupo de adolescentes, o que irá ser feito?

Rui Spranger disse...

Na minha adolescencia fumei muita ganza, snifei cloreto etilico, fugi de casa pala janela, reprovei de ano varias vezes, senti admiracao por skinheads, punks e afins e fui inclusivamente monarquico. E se falasse da adolescencia de alguns amigos meus, as historias seriam bem piores.