domingo, 28 de maio de 2006

Le Deserteur


Numa noite de Pinguim como muitas outras em que pequenas pérolas são transmitidas de mão em mão, o co-Pinguim Rui Spranger partilhou este tema da autoria de Boris Vian (se a memória não me trai interpretado pelos Têtes Raides).

Desde essa 1ª audição a força interventiva do poema não me sai da cabeça, por isso achei por bem partilhar a letra e a própria musica no original de Boris Vian.



Monsieur le président
Je vous fais une lettre
Que vous lirez peut-être
Si vous avez le temps

Je viens de recevoir
Mes papiers militaires
Pour partir à la guerre
Avant mercredi soir

Monsieur le président
Je ne veux pas la faire
Je ne suis pas sur terre
Pour tuer des pauvres gens

C'est pas pour vous fâcher
Il faut que je vous dise
Ma décision est prise
Je m'en vais déserter

Depuis que je suis né
J'ai vu mourir mon père
J'ai vu partir mes frères
Et pleurer mes enfants

Ma mère a tant souffert
Elle est dedans sa tombe
Et se moque des bombes
Et se moque des vers

Quand j'étais prisonnier
On m'a volé ma femme
On m'a volé mon âme
Et tout mon cher passé

Demain de bon matin
Je fermerai ma porte
Au nez des années mortes
J'irai sur les chemins

Je mendierai ma vie
Sur les routes de France
De Bretagne en Provence
Et je dirai aux gens:

« Refusez d'obéir
Refusez de la faire
N'allez pas à la guerre
Refusez de partir »

S'il faut donner son sang
Allez donner le vôtre
Vous êtes bon apôtre
Monsieur le président

Si vous me poursuivez
Prévenez vos gendarmes
Que je n'aurai pas d'armes

Et qu'ils pourront tirer

Boris Vian


Ao senhor presidente
e chefe da nação
escrevo a presente
pra sua informação

recebi um postal
um papel militar
com ordem pra marchar
prà guerra colonial

diga aos seus generais
que eu não faço essa guerra
porque eu não vim à Terra
pra matar meus iguais

e aqui digo ao senhor
queira o senhor ou não
tomei a decisãode ser um desertor
desde que me conheço

já vi meu pai morrer
vi meus irmãos sofrer
vi meus filhos sem berço

minha mãe sofreu tanto
que me deixou sozinho
morreu devagarinho
nas dobras do seu pranto

já estive na prisão
sem razão me prenderam
sem razão me bateram
como se fosse um cão

amanhã de madrugada
pego numa sacola
e na minha viola
e meto-me à estrada

irei sem descansar
pela terra lusitana
do Minho ao Guadiana
toda a gente avisar

à guerra dizei 'não!
'a gente negra sofre
e como nós é pobre
somos todos irmãos

e se quer continuar
a matar essa gente
vá o senhor presidente
tomar o meu lugar

se me mandar buscar
previna a sua guarda
que eu tenho uma espingarda
e que eu sei atirar

adaptação para português de José Mario Branco

créditos: http://natura.di.uminho.pt/~jj/musica/html/mariobranco-monsieurLePresident.html

5 comentários:

Cláudia S. disse...

Excelente escolha para começar a semana. O poema é lindo, e mais do que isso é um apelo à paz.

Unknown disse...

Desde míudo que os meus pais me habituaram à cultura francesa, a qual sempre admirei pela sua qualidade, desde Gainsbourg, a Vian, a Toulousse-Lautrec. A verdade é que me parece que este grande marco da cultura da segunda metade do séc. XX se tem vindo a dissipar. É certo que hoje damos muito mais relevância à cultura anglo-saxonica, já não falamos o francês com a fluência de outrora e isto é, obviamente, importante.
Contudo, podemos continuar a olhar para trás e recodar artistas como este que nos preenchem e nos ajudam a pensar. Grande Boris Vian!

Desconhecia este tema, mas gostei imenso! Boa escolha!

Rui Spranger disse...

Caro amigo,

A memória só te falha no caso dos Têtes Raides, que não fazem nenhum "cover" desta música.
Muito obrigado por este post porque esta música é sem dúvida uma das minhas paixões, no entanto, o que vem em português, não é uma tradução, mas sim uma versão do poema e que contraria muitas vezes o original.
Assim, se me perdoam, tentarei sem dicionário e sem preocupações rímicas fazer uma tradução masi proxima do original.


Senhor Presidente
escrevi-lhe uma carta
que talvez lerá
se tempo tiver

Acabo de receber
os meus papeis militares
para partir para a guerra
antes da tarde de quarta-feira

Senhor Presidente
eu não a quero fazer
eu não estou na terra
para matar as pobres gentes

Não é para vos fazer zangar
mas é preciso que eu lhe diga
a minha decisão está tomada
e eu vou desertar

Desde que nasci
já vi morrer o meu pai
vi partir os meus irmãos
e chorar os meus filhos

A minha mãe sofreu tanto
Ela está no seu tumulo
e borrifa-se para as bombas
e borrifa-se para as minhocas

Quando eu fui prisioneiro
roubaram-me a mulher
roubaram-me a alma
e todo o meu querido passado

Amanhã de madrugada
vou fechar a minha porta
no nariz dos anos mortos
e irei pelos caminhos

Mendigarei a minha vida
pelas estradas de frança
da Bretanha à Provença
e direi às gentes

"Recusem obedecer
recusem fazê-la
não vão para a guerra
recusem partir"

Se é preciso dar o sangue
vá então dar o seu
já que é um bom apóstulo
Senhor Presidente

Se me perseguir
Avisai os vossos guardas
que eu não terei armas

e que eles podem atirar


Boris Vian


Esta tradução também é péssima, mas creio que pelo menos não comete a imprudência de dizer que ele tem uma espingarda e que sabe atirar.
Note-se também que esta música foi escrita durante a guerra da Argélia e que esteve proibida em frança durante muitos anos.

Um abraço

Rui Vieira disse...

Confiar na memória tem destas falhas. Obrigado pela correcção, Rui.
Entretanto, quero precisar 2 aspectos sobre a "tradução" de José Mario Branco. Como está no Post, trata-se de uma adaptação, pelo que ganha logo alguma liberdade.
O 2º aspecto tem a ver com os ultimos 2 versos do poema. A versão original ia de encontro à adaptação de J M Branco, no entanto, Boris Vian terá aceite a sugestão de alteração que o seu amigo Moloudji fez no sentido de conservar o caracter pacifista do poema. (verifiquei em várias fontes)

Rui Spranger disse...

Eu claramente tinha percebido tratar-se de uma adaptação ou "versão portuguesa" como eu lhe prefiro chamar. E como versão está muito bem feita, mas creio que o original francês é mais forte.

Abraços