sábado, 13 de maio de 2006

Fado, Futebol e Fátima

Ontem, enquanto ía de carro até ao Pinguim, ouvi uma coisa que não ouvia há muitos anos, o 13 de Maio dos Xutos e Pontapés.

Lembrei-me, inevitavelmente, daquilo que significa o 13 de Maio e senti mais uma vez que continuamos na mesma.

Já vem sendo habitual, ao longo dos anos dizer-se que Salazar usava o Fado, o Futebol e Fátima para distrair o povo para traçar a sua grande estratégia sem que houvesse muito alarido. Esta é uma situação típica em sistemas como o antigo regime, e não querendo comparar, alguns artistas como Chico Buarque ou Vinicius de Moraes falavam desta situação no seu país, mas numa escala mais preversa.

O Fado de Amália, o Futebol de Eusébio e Fátima, o centro do fanatismo católico em Portugal. Poderíamos estar a falar disto como uma coisa passada, algo que está enterrado num Portugal diferente que alguns tentam esmagar. Mas a memória não se apaga quando os factos continuam bem presentes e vivos, no entanto encobertos. E que melhor dia para falar nisto pode haver?

Hoje 13 de Maio, último dia da Queima das Fitas da Academia do Porto, véspera da Final da Taça de Portugal. O povo continua distraído!!! Caminham uns num desespero de lamúrias lavadas em àgua benta, e de promessas cuidadosamente atiradas para o reino anárquico das velas, outros caminham trôpegos pelo meio de um chão imundo e de um cheiro insuportável a urina com 5 dias, envergando o diploma numa mão e o freepass para as urgências na outra, os últimos gritam o golo com a raiva e a força com que gostariam de mandar o patrão à merda. Do outro lado já não está Salazar, está uma democracia, um estado social de direito, a evolução de Abril. Mas o povo continua agarrado aos três F’s, que estranho! E a liberdade de expressão, o protesto pelos direitos dos mais fracos e oprimidos, o voto livre e universal, a consciência cívica e a evolução cultural? O povo quer é festa! E já não é só o povo, meninos burgueses também... Ah os senhores doutores do futuro do amanhã, tão bêbedos que eles estão, que engraçado! -Avé Maria cheia de graça... olha que mal vestida que esta vem, Santa Maria mãe de Deus... rogai por nós sim que não só somos pecadores como também somos mercenários, -As velinhas é o que quiser dar, só uma contribuição! – Ohhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh Filho da Puta!

Dos fanatismos à decadência, da mediocridade à estupidez, não há limites.

Fico então em casa, em pânico, até que de repente um senhor canta no rádio «Não te aflijas que tudo vai já passar», então fecho os olhos e acalmo a inquietação... não é fácil!

2 comentários:

Rui Vieira disse...

Nesse mesmo dia 13 de Maio, enquanto uns "Srs Drs. do futuro" iam aliviando a ressaca... um grupo de saudositas dos 3 F's marchavam sobre Vila de Rei contestando a imigração (aliás, "contra a invasão, contra a substituição demografica de portugueses por estrangeiros", segundo o lider do PNR presente na manifestação).
Recuando novamente ao tempo dos 3 F's, nessa época eram os portugueses que marchavam... pelo mundo fora em busca de um sonho que se escondia cada vez mais sob a terra esgravatada.
Fado justificava-se pela necessidade de mostrar a dor. Futebol pela necessidade de enganar a verdade. Ave Maria, pela necessidade de acreditar.

António Manuel Rodrigues disse...

O Bicho-Homem é muito estranho... 32 anos depois os 3 F's continuam a calar o povo de brandos costumes, continuam a ser utilizados pelo(s) poder(es) e continuam a dar-nos festa...

A verdade é que sinto a ambiguidade do costume, se por um lado sinto panico pela mediocridade portuguesa, por outro alegro-me por esta nossa rebeldia inconsciente...

Continuamos a ser feitos de fado, mas já não o ouvimos, continuamos a vibrar com o futebol, mas já não somos sócios do Benfica, continuamos a ser católicos, mas já não acreditamos na Igreja...

A minha esperança é que da nossa ignorancia nasça a nossa salvação!

(Hoje, até eu acho que me excedi... Lirico...)