Uma das minhas paixões é o teatro. Apaixonei-me quando ainda brincava com bonecas e inventava histórias, onde fazia as vozes de todos as personagens. No 9.º ano dei vida ao “Joanne” do “Auto da Barca do Inferno”. Nessa altura queria era estar em cima dum palco e dizer o texto, contagiada pelo público e por todo um crescente de emoções.
Mais tarde aprendi que representar é mais do que isso, é mais do que os ensaios. Representar é vestirmos o texto, as palavras de um outro alguém bem diferente de nós. Uma peça de teatro é mais do que os actores, os encenadores e os textos. Teatro são figurinos, cenários, adereços, som, luz, e música. A música pode ser um excelente companheiro em palco para um actor. Tive essa experiência numa peça que fiz na faculdade. Os textos eram de Heinner Muller. A ideia do encenador era transformar a peça no desconstrutivismo total. Depois, chegou à conclusão de que fez a peça toda, tendo um vestido vermelho como fonte de inspiração... mas forçada. O vestido tinha sido imposto por mim e foi usado só na cena final, quando representei a morte de Electra com um véu vermelho. A ideia do véu já foi do encenador. Mas o que deu um maior impacto à cena foi a música, também escolha do encenador.
Na altura eu andava sempre a cantarolar “Somewhere Over the Rainbow” do filme o “Feiticeiro de Oz”, imortalizada pela Judy Garland e uma das músicas que já inspirou centenas de cantores. O encenador ouviu-me a cantarolar e apesar de eu desafinar fez com que ele trouxesse no ensaio seguinte uma versão que não conhecia, cantada por Blixa Bargeld. Uma música inicialmente estranha que destrói a música infantil e que a volta a vestir de novas tonalidades. O desconstrutivismo total. Nesta situação foi entendido como destruir para construir de novo.
Não conhecia Blixa Garbeld e ainda não o conheço bem, mas esta música inspirou-me pela voz que se entranha em nós. Representar é deixarmo-nos levar e sermos livres com as palavras de um, as roupas de outro, a música de um outro, mas a alma essa é a nossa, apesar de transfigurada.
“Somewhere over the Rainbow” na versão de Blixa Garbeld é a minha escolha para hoje.
http://www.blixa-bargeld.com/
http://www.mondobizarre.com/e_blixa.html
6 comentários:
Não poderia haver escolha melhor! Este tema é como uma Fenix Renascida depois da derrota de ontem. Mas para além disso vem reforçar tudo aquilo que sinto em relação a Blixa que vou acompanhando desde que o conheci através dos Bad Seeds, a banda de Nick Cave.
Blixa é também o criador de Einsturzende Neubauten uma banda de industrial poderozissima, mas já não tão acessível. É um homem com um coração forte e com uma voz meiga, que escreve temas de amor e esperança com esta melancolia gigante.
Obrigado e muito boa escolha mais uma vez!
Gostei...
Não conhecia esta versão, mas confesso que foi uma agradavel surpresa.
O tom de voz associado à melancolia transportam-me para outras paragens...
Já agora, tentem ouvir as versões do Keith Jarret e do Tony Bennett que são igualmente mágicas.
confesso que sou uma coleccionadora de versões.Desta música tenho cerca de 40 versões.
Este foi daqueles temas pelos quais me apaixonei à 1ª audição. Claro que a apresentadora da música também teve a sua culpa no cartório ;)
Destaco a qualidade do post em conseguir mostrar-nos a qualidade do Blixe na desCONSTRUÇÃO do tema.
Uma nota sobre o Blixe e os Einsturzende. Vi-os a actuar num festival nos Arcos de Valdevez com a sua panóplia de objectos industriais (serras eléctricas, chapas metálicas, correntes, etc)mas o tema melhor conseguido foi "Sexy (silence is)" em que a voz de Blixe contracena apenas com um cigarro. Brilhante!
Tambem eu não conhecia a versão e devo dizer que me prendeu a atenção desde o inicio. A voz e o piano são deliciosos.
Obrigado Claudia
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